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Christmas blues. Como combater a “tristeza natalícia”?

13 Dez 2023 - 10:27

Christmas blues. Como combater a “tristeza natalícia”?

Os momentos em família, a abundância, a troca de presentes e a partilha de comida típica fazem do Natal a celebração preferida de muitas pessoas. Numa época cheia de expectativas e de eventos para planear, é comum julgar-se que toda a angústia e tristeza deve ser deixada de lado nesta altura do ano.

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Por isso mesmo é que, para muitos, a ideia de ficar triste no Natal causa estranheza. No entanto, ter vivido um ano atribulado, perdido um familiar, um trabalho, terminado uma relação ou não ter conseguido cumprir todas as resoluções do ano podem tornar esta época mais difícil de viver e provocar os chamados “Christmas blues”. Mas o que é esta  “tristeza natalícia”? E como combatê-la?

Em declarações ao Viral, Ana Isabel Lage Ferreira, membro da direção da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP), e Filipa Caetano, psiquiatra e psicoterapeuta cognitivo-comportamental, esclarecem o conceito de “Christmas blues” e deixam alguns conselhos que podem ajudar a ultrapassar a “tristeza natalícia”.

O que são os “Christmas blues”?

Antes de explicar o conceito “Christmas blues”, ou “tristeza natalícia”, Ana Isabel Lage Ferreira considera importante perceber-se a definição de tristeza. 

Segundo a psicóloga, “a tristeza é uma emoção que, em qualquer circunstância, sinaliza a perda ou a falta de alguma coisa ou alguém”. 

Como explica a especialista, a tristeza pode ser desencadeada por várias circunstâncias, “uma pessoa que morreu”, “uma relação que se quebrou”, “alguém que está fora”, “a perda de um emprego ou de uma casa” e, até, o não cumprimento de projetos como “mudar de casa”, “estar numa relação” amorosa ou “ter filhos”.

No fundo, resume, a tristeza indica que “falta alguma coisa” e, no Natal, por norma, “damos-lhe uma relevância maior”. Isto porque “o Natal tem um significado de plenitude, de abundância,, com muita comida, pessoas, animação e alegria”, justifica. 

Assim, como representa o oposto da tristeza, “é muito dissonante” quando surgem os “Christmas blues”, porque aparecem “numa altura em que não é suposto”, acrescenta.

No mesmo sentido, a psiquiatra Filipa Caetano admite que, em consulta, são-lhe relatados casos desta espécie de “tristeza natalícia”. Por esta altura, “algumas pessoas – sobretudo as que já têm alguma predisposição ao humor mais depressivo, ou alguma tristeza mais basal – podem agravar esses sentimentos”, refere.

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Para mais, fatores como “a expectativa da sociedade e até, às vezes, dos amigos, de se ter de realizar muitos eventos”, pode “deixar a pessoa ansiosa também, sobretudo se houver ansiedade social de base”, explica a especialista.

Por outro lado, o consumismo típico do Natal pode, de igual forma, levar a alguma frustração e tristeza. “Se a pessoa tiver algumas dificuldades económicas e, se tiver, por exemplo, uma família grande com crianças, pode sentir-se frustrada por não conseguir oferecer aquilo que a família espera”, exemplifica Filipa Caetano.


Além das causas mais ligadas ao Natal, a psiquiatra aponta ainda um fator importante: “a sazonalidade”. 

Na visão da médica, “os dias mais curtos (com menos sol)” e as condições meteorológicas características do inverno “também estão associados a uma sintomatologia depressiva, a uma tristeza, embora não seja uma depressão propriamente dita”.

A passagem de ano também pode desencadear um sentimento semelhante?

Na perspetiva de Filipa Caetano, “a passagem de ano também ainda está um pouco englobada” nesta época festiva, até porque durante esta celebração surge, com frequência, a necessidade de “recapitular o ano” e podemos ficar presos aos objetivos não cumpridos.

No entanto, “o virar do ano pode ser, sobretudo, positivo para algumas pessoas, porque indica um novo começo”. Assim, por norma, “a tristeza relacionada com a época até melhora”, defende.

No mesmo sentido, Ana Isabel Lage Ferreira considera que a tristeza na passagem de ano “é menos intensa” e “não é tão dissonante”. Isto porque a celebração de ano novo “é um momento de festa muito exuberante e catártico”, em que “falar sobre aquilo que se sente ou ir a uma festa sozinha” não é visto de forma estranha.

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Já o Natal “apela para a ideia de reunião, família, conforto e abundância”, lembra. Há muito aquela ideia de que “o Natal é suposto correr bem” e, se não correr, sente-se muito essa diferença.

Como combater a “tristeza natalícia”?

As duas especialistas entrevistadas pelo Viral apontam algumas medidas que podem ajudar a ultrapassar os “christmas blues”:

1 – Aceitar a tristeza natalícia

Do ponto de vista de Ana Isabel Lage Ferreira, “o primeiro passo é a pessoa aceitar que está triste” e que isso tem a ver consigo. 

Se não houver essa aceitação, a tristeza “pode evoluir para quadros emocionais mais complexos”, incluindo “a frustração, a raiva e a irritabilidade”, que podem desencadear “isolamento, dificuldade em estar com as pessoas”. 

2 – Apostar no autocuidado

Filipa Caetano acredita que “temos de nos focar no que podemos realmente controlar”. Por isso, quando algo foge ao nosso controlo, é importante privilegiar o “autocuidado”. 

Portanto, a psiquiatra aconselha que se faça “coisas que nos façam sentir bem” e que sejam “boas para a saúde, como caminhadas, estar com amigos e, sobretudo, ser-se sincero com as pessoas à nossa volta”.


3 – Encontrar conforto nas pessoas mais próximas

As duas especialistas concordam que uma das medidas mais importantes é pedir ajuda e compreensão às pessoas mais próximas

Se a pessoa “não se sente bem”, se “está preocupada”, se “sente a falta da pessoa que perdeu”, então, “falar daquilo que sente é sempre uma boa estratégia”, defende Ana Isabel Lage Ferreira.

Por norma, “quando isto acontece e falamos com as pessoas que estão de facto próximas – como um amigo ou um parceiro – vamos ter esse apoio emocional”, salienta.
Isto, desde logo, “já pode fazer com que a pessoa não se sinta tão sozinha”, conclui.

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4 – Pôr as coisas em perspetiva: “A minha vida não é só este Natal”

Ana Isabel Lage Ferreira recomenda que se “olhe para a minha vida como se fosse um friso cronológico”. Isto é, apesar de reconhecer que este Natal não foi bom, ou como a pessoa esperava, também perceber que: “A minha vida não é só este Natal, já houve vários bons e vai haver outros. Este não é ‘o’ Natal, é só mais um”. 

Assim, a ideia é “colocar este momento numa cronologia da vida para pôr as coisas em perspetiva”, esclarece a psicóloga.

Quando procurar ajuda profissional?


Filipa Caetano considera importante “ter atenção ao grau de impacto que esta tristeza tem no dia a dia da pessoa”. 

Nesse plano, aponta Ana Isabel Lage Ferreira, talvez seja necessário procurar ajuda profissional “no momento em que a pessoa sente que os recursos disponíveis podem não ser suficientes”, ou seja, “se falar com alguém ou ter alguém por perto não é suficiente, se a pessoa não se consegue acalmar e se continua desorganizada, instável e reativa”.

Outros sinais de alerta, na visão de Filipa Caetano, são quando a pessoa: “deixa de trabalhar”; “diminui muito o apetite e até perde peso”; “sente, para além desta tristeza, ansiedade”; tem “insónias”. 

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Sobretudo, deve-se perceber se essa tristeza e esses sinais “persistem”. Porquê? A depressão é uma doença em que a tristeza (e outros sintomas) perduram ao longo do tempo.

Em contrapartida, de modo geral, a tristeza natalícia verifica-se “em momentos do dia, quando a pessoa se lembra da época”. Por exemplo, “no trabalho a pessoa até consegue funcionar, até está distraída, mas depois há algum trigger [gatilho] que desencadeia o agravamento da tristeza, como ir a um shopping com luzes natalícias, ou lembrar-se que tem que comprar presentes”.

Assim sendo, quando se percebe que esta tristeza é muito intensa e prolongada, afetando a qualidade de vida e as ações do dia a dia, deve-se procurar ajuda profissional.

Categorias:

Saúde mental

13 Dez 2023 - 10:27

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